Martine Valo

13 de janeiro, 2021

Como frear as fontes de desmatamento que se multiplicam no planeta

“Apesar de tratados e compromissos internacionais de grandes empresas, a perda de florestas não foi estancada, muito menos revertida”, afirma a ONG WWF.

As frentes de desmatamento estão se multiplicando e se espalhando, alerta o Fundo Mundial para a Natureza, o WWF. A Terra, que era 50% florestada há oito mil anos, agora é apenas 30%. Não apenas novas áreas sujeitas a incêndios e desmatamento estão aparecendo na África (na Libéria, Gana, Madagascar) e na América Latina ( especialmente no México e na Guatemala), mas a destruição de selvas, florestas primárias, florestas secas e savanas arborizadas está se acelerando em todo o planeta.

Em relatório divulgado na quarta-feira, 13 de janeiro, a ONG identifica e analisa as 24 principais frentes de desmatamento em trinta países. Cinco anos após a análise anterior, a situação piorou ainda mais: só essas 24 frentes ameaçam um quinto das florestas tropicais do mundo.

Essas regiões perderam, entre 2004 e 2017, pelo menos 43 milhões de hectares, ou mais de 10% de sua cobertura florestal. Quase metade (45%) das áreas arborizadas restantes estão agora fragmentadas por estradas ou outra infraestrutura, o que as enfraquece e as torna mais vulneráveis a incêndios e mudanças climáticas. América Latina, Madagascar, Sumatra e Bornéu para o Sudeste Asiático estão entre as áreas mais afetadas.

“A tendência não é boa”, observa Véronique Andrieux, diretora-gerente do WWF França. “Apesar de todos os tratados internacionais, apesar dos muitos compromissos de ‘desmatamento zero’ assumidos por grandes empresas, a perda de florestas não foi estancada, muito menos revertida em comparação com nossa avaliação anterior de 2015. No entanto, vale a pena lembrar que entre todos os serviços ambientais que nos fornece, a floresta pode proteger os humanos das zoonoses [infecções transmitidas de animais para humanos]“.

Entre a pandemia Covid-19 e os vários encontros internacionais dedicados ao resgate da biodiversidade, 2021 parece ser “ um ano absolutamente crucial”, ela diz.

Agricultura, mineração

A agricultura continua sendo a força motriz essencial por trás do avanço de terras desmatadas cada vez mais nos espaços naturais. Preservados há muito tempo, esses portos servem de habitat para muitas espécies, mas também para vírus. Este setor suplanta o impacto da exploração de recursos minerais e madeireiros – seja para exportar esse recurso ou para fornecer combustível para aquecimento às populações locais.

Palmeiras plantadas com linha em fazendas até onde a vista alcança, pastos gigantes obtidos após fogos gigantes para abrigar rebanhos de bois, quilômetros quadrados de plantações de soja destinadas ao setor de agrocombustíveis: todos esses motores de conversão natural do espaço são agora conhecidos.

Mas, sob o efeito do crescimento demográfico, pequenas safras comerciais, ou mesmo apenas alimentos, agora também estão corroendo as bordas das florestas, na África em particular. Assim que se abre uma estrada na selva, os agricultores que precisam de terra vêm para semear legumes, cereais ou plantar um ou dois cacaueiros, como em Gana e na Costa do Marfim, onde  se devastou a maioria das florestas, mesmo nos parques nacionais, com o crescimento do apetite dos países desenvolvidos por chocolate.

Especulação fundiária, corrupção das elites locais, economia subterrânea, variações nos preços dos mercados de commodities: todos esses elementos influenciam a evolução do desmatamento. Dados oficiais indicam, por exemplo, que a perda de selva na Indonésia foi de mais de 1 milhão de hectares por ano no início de 2000, bem como em 2014-2015, após cair para menos de 500.000 hectares por ano de 2009 a 2011.

Soluções adaptadas aos contextos locais

Os dados de satélite que alimentam a análise do WWF confirmam a expansão vertiginosa da agricultura industrial no Gran Chaco, região que se estende entre o Brasil, a Argentina, a Bolívia e o Paraguai.

Este desenvolvimento seguiu a moratória de 2006 aceita pelos comerciantes brasileiros em qualquer parcela de soja recentemente conquistada para terras amazônicas. Desde então, a produção se espalhou rapidamente para o sul. Este é um dos limites da conservação dos espaços naturais.

Sem surpresa, o relatório afirma que não existe uma abordagem única para o problema. Além de respostas óbvias como o estabelecimento de áreas protegidas, preconiza soluções múltiplas e integradas, adaptadas aos contextos locais, combinando incentivos e controle. E exorta “a afirmação dos direitos dos povos indígenas e comunidades locais [que] devem tornar-se uma prioridade”.

O respeito por suas terras ancestrais e suas culturas não pesa muito diante de uma operação de extensão agrícola ou uma nova operação de mineração. Às vezes, até acontece que um projeto inflexível de conservação da vida selvagem ajuda a expulsar essas populações de suas florestas.

Papel decisivo das escolhas dos investidores financeiros

Os autores do relatório sublinham o papel decisivo das escolhas dos investidores financeiros a favor de um determinado tipo de uso do solo. É responsabilidade dos atores financeiros mitigar os riscos de conversão dos espaços naturais e das políticas públicas para buscar a solução dos conflitos decorrentes.

Pagar os agricultores pela conservação ou compensação da biodiversidade pode ser uma resposta, desde que o programa seja amplo e sustentável.

O combate ao desmatamento importado não se contenta com respostas territoriais, mas também com mudanças profundas no comércio internacional de matérias-primas. A França se posicionou como pioneira nessa abordagem, mas sua estratégia só terá impacto em escala insuficiente.

Durante a One Planet Summit que se realizou em Paris, em grande medida por videoconferência, a convite de Emmanuel Macron, na segunda-feira 11 de janeiro, a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, confirmou que uma iniciativa neste sentido deveria ser apresentada neste ano. Para Véronique Andrieux, a questão do desmatamento é tal que mais deve ser feito: “É a nossa economia, nossos sistemas alimentares e nosso modo de desenvolvimento que devemos mudar. »

 

Imagem: Próximo ao Parque Nacional da Amazônia, em Itaituba, no Estado do Pará (Brasil), em 2012. NACHO DOCE / REUTERS
Fonte: https://www.lemonde.fr/planete/article/2021/01/13/les-fronts-de-la-deforestation-se-multiplient-sur-la-planete_6066037_3244.html

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