Fabiana Maia

Fabiana Maia

Psicóloga Integrativa; Comunicação Não Violenta e Luminous Coaching.

Fabiana Maia: O Homo-Empathicus está chegando

Há alguns milhares de anos surgiu o Homo-Sapiens. Dominou o planeta ao sair de sua frágil condição física e assumiu o topo do ranking da cadeia alimentar com sua racionalidade, capacidade de tomar decisões, confeccionar ferramentas e “domar” o fogo. Aqueles que eram mais inteligentes, dotados de maior capacidade analítica, estratégica e avaliativa, mais dominavam outros reinos (o vegetal e o mineral), outras espécies e mesmo outros “homens-sabidos”.

E aqui estamos nós: dominadores ameaçados no oceano dos conflitos. Conflitos com familiares, com vizinhos, colegas de trabalho, com sistemas sociais inteiros e conflitos com nós mesmos. A sapiência que desenvolvemos parece não nos servir muito para irmos além deste pântano escuro das relações.

Em meados do século passado uma série de pesquisadores começou a falar de outras inteligências, como a emocional, a relacional, a espiritual e a social. Um espaço se abriu para fortalecermos uma musculatura até então atrofiada: a conexão empática, possível somente quando se está disponível para uma experiência de transcender o hábito de ter razão em todas as discussões, conversas, debates e reuniões.

De repente, ter razão e ser o vencedor daquela disputa racional, perde todo o sentido; deixa de ser o foco ou o objetivo, pois começamos a perceber que estávamos gastando tanta energia nesse jogo de ganha-perde, de dominado-dominador, com resultados cada vez mais empobrecidos e a depressão reinando.

O jogo do ganha-ganha passa a ser aquele em que cuido de mim, falando as verdades que estão mais vivas aqui dentro, ao mesmo tempo em que confio que posso abrir espaço para o(s) outro(s) também serem cuidados. E para isso, preciso duvidar dos pressupostos e script dos papéis sociais (por exemplo: como uma “boa mãe” deveria falar com seu filho…).

Aqui está a quebra de paradigma… da forma mais concreta, visível e possível!

Até então havia uma configuração dualista em que era fácil localizar um ganhador e um perdedor. Para sentir alívio da pressão interna, despejo minhas verdades e o outro que trate de ver o que faz com a bomba que explodiu no seu colo ou, de forma contrária, engulo os incômodos para não “machucar” o outro e gerar um novo incômodo, o famoso “deixa para lá”. Sempre há alguém violentado e algum violentador nesse modelo. Beco sem saída!

Ao abrir mão de ter razão e tentar convencer os envolvidos na cena de quem está certo e quem está errado, busco me conectar com o que está vivo ali. Pesquiso os sentimentos que dão pista das necessidades atendidas ou não atendidas, assim como a fumaça anuncia que ali tem fogo.

Quando revelo que as necessidades, valores, interesses…ou seja, a verdade que experimento dentro de mim, encontram espaço ou caminhos para se expressarem, legítimo a vida e não há mais sentido em recorrer ao hábito limitador de fazer avaliações, diagnósticos e julgamentos que tanto me afastam do outro e de mim mesma. Parece um passe de mágica… é possível sentir na frequência do batimento cardíaco, na pressão arterial, na respiração. Uma calma e um alinhamento vão surgindo ao reconhecer minha humanidade compartilhada com a humanidade do outro que tem necessidades como as minhas.

Nessa abordagem, nosso foco se dirige mais àquilo que nos liga aos outros, àquilo que é humano e universal e, portanto, compartilhado com todos os seres humanos, do que com aquilo que nos torna diferentes.

Cabe a nós agora nos matricularmos na escola de educação emocional, pois há um “treino” necessário já que parecemos tão distantes de “escutar” e poder expressar nossas necessidades, e ainda tão longe de nos conectarmos com aquelas necessidades de nossos interlocutores. Dessa forma, sentimentos de medo, raiva e tristeza imperam nas relações. Fugimos dos conflitos, ou queremos acabar logo com eles, por profunda incompetência relacional. Transcendemos esse padrão quando aprendemos a apreciar o conflito como uma manifestação de que há vida querendo ser renovada nas relações.

Não escutar com empatia o outro pode ser violento, interromper enquanto o outro fala também, mas não valorizar suas necessidades e ceder para o desejo do grupo, pode também ser uma violação de si mesmo, ainda que a forma de se comunicar seja doce. Não-violência não tem nada a ver com ser bonzinho/boazinha, não desencadear conflitos ou tensões… pelo o contrário se trata de se cuidar ao ponto em que sua autenticidade pode ser expressada (idealmente) na mesma medida em que o espaço (real e emocional) para o outro se expressar seja honrado.

Se sou capaz de me vulnerabilizar e compartilhar poder, fortaleço a conexão entre meus familiares, parceiros, companheiros, colegas de trabalho (pares, chefes, subordinados e outros) posso assim, co-criar com eles as bases para mudanças consistentes e sustentáveis e que contemplem a todos.

A empatia é uma chave importante nesse processo. Ao esvaziar a mente de julgamentos e OUVIR com toda presença, atenção e abertura, para poder reconhecer as necessidades e sentimentos do outro, surge a empatia. Não é preciso concordar, nem discordar quando o objetivo é fortalecer a conexão e chegar em acordos e pedidos que sejam ganha-ganha.

“A empatia é a compreensão respeitosa do que os outros estão vivendo.” Marshall Rosenberg, principal autor da Comunicação Não Violenta.

Auto-responsabilização pelas escolhas e suas consequências seja experimentada em sua plenitude. Como humanidade, assumimos a responsabilidade pelas atitudes de exploração dos recursos naturais que nos últimos séculos levou nosso planeta à situação de desequilíbrio que hoje se encontra.

Ainda que o vitimismo tenha se enraizado há milênios, especialmente na cultura ocidental, urge a necessidade de cada indivíduo assumir o papel de protagonista da cena de sua vida e se responsabilizar pelas consequências de suas escolhas, “empoderando-se”. Só assim, seremos capazes de empoderar os que nos cercam.

Quem surge agora é o homo-empathicus, o homo-luminous ou homo-pacem. Quem sabe poderemos substituir o lema cartesiano que vem nos definindo como espécie: “penso, logo existo”, por “escuto, sinto e conecto, logo existo”?

Fonte: https://medium.com/fabi-maia/o-homo-empathicus-est%C3%A1-chegando-de207eaefed4

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